Hoje não tem jeito, afinal é segunda-feira e metade do segundo bimestre, nem posso dar a desculpa do uniforme porque o meu pai já comprou a camiseta. Não faço a mínima ideia do que está por vir, pois mal tive tempo de conhecer os vizinhos já que nos mudamos para cá semana passada.
É meu primeiro dia na escola nova e já sei o caminho, então minha Amanda deixa eu ir sozinha, mesmo sendo na mesma direção do trabalho dela. Papai não me leva a escola porque sai mais cedo que eu para trabalhar.
Mas, o que mais me preocupa é se eu vou conseguir me enturmar fácil, pois eu lembro que na minha antiga escola havia muito bullying no começo com quem vinha de fora (na verdade o bullying era com todo mundo, pois eu estudava em escola pública).
Obviamente já estou preparada para os apelidos pelo fato de ser ruiva, ter sardas no rosto, ser canhota e gostar de estudar. Não vou ser dramática também, depois de algum tempo a gente aprende a lidar com a situação.Aprendi que se a gente levar na esportiva o pessoal se cansa e não fica incomodando tanto como no começo.
A cidade de Castilho tem apenas duas escolas de ensino fundamental e médio, elas ficam literalmente ao lado uma da outra. Vou até a secretaria com um papelzinho em que minha mãe anotou a turma pra mim para perguntar onde fica a sala. A secretária me pergunta se eu vim de outra cidade. Digo a ela que sim e antes mesmo de eu entregar para ela o papel ela diz que é na escola ao lado. Pergunto desconfiada se ela tinha certeza e ela me diz que se eu não errei de escola comprei o uniforme errado. Passam alguns alunos do meu lado e vejo que o uniforme não tem nada a ver com o que estou usando. Acabo de pagar meu primeiro mico!
Dou meia volta e assim que entro bate o sinal. Chego na secretaria e não vejo ninguém, fico parada sem saber o que fazer e de repente aparece um homem gritando na minha frente para os alunos:
— Vão pra sala pessoal vocês já estão atrasados! Agora todo dia vai ser essa palhaçada? Vamos gente, vamos!
Continuo esperando como se não fosse comigo. E o cara já vem perto de mim:
— Mocinha, eu não tenho o dia todo, vamos?
Respondo bem baixinho:
— Desculpa moço, é que eu tô esperando alguém da secretaria…
Ele faz uma cara feia e aponta para uma folha em que está escrito o horário de atendimento da secretaria.
— É que eu acabei de me mudar e não sei onde é minha sala.
— Bom dia gente, tudo bem?
Entra um homem com humor totalmente diferente do que estava me atendendo.
— Mais ou menos Félix, hoje tá uma correria já cedo.
— O que está acontecendo?
— Essa menina que veio não sei de onde e não sabe pra onde vai e fica empacando tudo aqui!
Eu tô ouvindo (penso comigo, mas prefiro não provocar).
— É você que veio de São Paulo? (Ele me pergunta).
Faço que sim com a cabeça e ele faz um gesto com a mão para que eu o acompanhe.
— A primeira aula na sua sala é a minha, então se quiser pode me acompanhar.
— Mas como você tem certeza?
— Bem, a escola meio que está com falta de funcionários, então as vezes eu acabo ajudando na secretaria quando não estou em sala de aula e por coincidência fui eu que preenchi sua transferência…
Enquanto o professor me acompanha, tento puxar conversa:
— Você é professor de quê?
— Hum… Eu tenho cara de professor de qual matéria?
— Acho que é Educação Física ou Artes…
— Boa tentativa! Mas errou.
Ele sorri, mas não responde qual é a matéria… (Que raiva!)
O professor então me acompanha até metade do corredor e fala para eu entrar na sala quatro que ele já volta porque esqueceu de trazer giz para a lousa.
Entro na sala que já está cheia e para minha surpresa as carteiras são iguais as da minha antiga escola. Vejo uma carteira de canhoto desocupada ao lado da janela, já sei onde será o meu lugar. Coloco a mochila atrás da cadeira e alguns alunos começam a me olhar com aquele ar de curiosidade.
A maioria me dá um oi meio tímido e alguns risinhos. Exceto um menino da carteira de trás. Uma menina vem puxar papo comigo:
— Oi menina, tudo bem?
— Tudo e você?
— Você é aluna nova?
— Sim. (Tento ser educada, mas acho que estava meio óbvio,não é mesmo?)
— Qual é o seu nome?
— Meu nome é…
— Ferrugem, sai do meu lugar!
Um menino grita comigo jogando o material em cima da mesa.
— Foi mal, eu não…
— Tá, sai logo!
— Também não precisa ser estúpido! (Começo a me irritar)
— Richard, deixa ela aqui, hoje é o primeiro dia dela!
— Não tô nem aí Melissa, todo mundo sabe que esse lugar é meu!
— Deixa a ela aí cara! Você mais falta do que vem. Falando nisso você não tava de suspensão?
— Não é da sua conta, Hudson! Tá defendendo ela por quê? Tá querendo ficar com a esquisitona?
— Meu, ela sentou aí porque ela é canhota!
— Eu também, sou!
— Você? Nem escrever você sabe e quer fazer graça aí!
— Tá querendo brigar é?
— Por quê? Você quer?
— Bom dia pessoal, nos lugares!
Eles ficam um tempo se encarando e quando eu penso que eles vão acabar brigando… O professor chega e interrompe a discussão dos dois e no final Richard senta eu uma carteira a frente da minha.